Apesar da profunda tristeza que sinto, sorrio sempre que me vêm à memória fragmentos do passado... E são tantos... E tão bons!
Recordo-te há dezoito ou dezanove anos atrás, quando te conheci numa qualquer festa em casa da Sónia. Recordo-te há cinco anos atrás, quando te reencontrei por acaso! E descubro que só tenho boas memórias...
Daqueles tempos guardo as tardes passadas no Bairro, as festas em casa da Sóninha, os slows das festas de garagem, as tuas gravatas (sim, porque tu começaste a trabalhar muito antes de qualquer um de nós, e chegavas sempre com o teu ar muito profissional e arrumadinho!), os peões que nos divertíamos a fazer no recinto onde é hoje o mercado de Carcavelos (muito sofreu nas tuas mãos aquele Nissan Micra vermelhinho que era tão, mas tão giro!), uma ou outra ida nocturna à praia, aquele convite para ir almoçar a Évora que eu nunca aceitei ("- Ele 'tá louco. Évora é no cú de Judas!!!"), o número do teu pager (sim, somos do tempo dos pagers!!!)... E todas as coisas que descobri contigo... E foram tantas...!
Acabámos o liceu, mas continuámos a encontrar-nos de vez em quando, aqui ou ali, trocando novidades, pondo a conversa em dia, matando saudades... Até que o rumo da vida nos separou, e seguimos caminho sem sequer pensar muito nisso! Um telefonema ou outro apenas, cada vez mais espaçados no tempo. Devem ter passado alguns anos até que eu voltei a ter notícias tuas... Foi quando cheguei de Lua-de-Mel, e a minha mãe me disse: "- Olha, sabes quem ligou à tua procura? O Renato!". A minha mãe adorava-te (tão ingénua...)! Falámos nessa altura. Trocámos novidades e voltámos às nossas vidas!
Depois, por um daqueles acasos da vida que ninguém percebe, reencontrei-te há cinco anos! Foi por esta altura! Estávamos perto do final do ano...! Tu estavas igual, e eu já não era uma miúda! Não sei exactamente há quantos anos não te via... Mas, no essencial, nada tinha mudado. Tomámos um café e conversámos. Contei-te da morte da minha mãe e tu recordaste-a com tanto carinho...! Relembrámos coisas do passado, e tu lembravas-te de coisas que eu já tinha esquecido.
Recordaste-me uma conversa tida há muitos anos, à porta de casa dos meus pais...! Parecia que estavas a vaticinar o futuro! Quem diria...! Lembro-me que na altura não te respondi, mas pensei "'Tá louco!". Mas não, não estavas! Estava mesmo a acontecer... Tal como previras não sei quantos anos antes!
Partilhámos tâmaras, dúvidas, bolo-rei , desabafos...! Aprendi a gostar de sushi... Vá-se lá saber porquê! Até que a vida nos separou de novo, mas desta vez pela força!
"- Esquecemo-nos!"
"- É melhor...! Quem sabe um dia... Daqui a uns 10 anos!"
Mas não passaram sequer dez anos! Passaram quatro... E desta vez não foi a vida que nos separou... Foi a morte... A tua morte, inesperada e prematura.
Hoje, o passado longínquo e o passado recente misturam-se na minha memória. E, apesar dos encontros e desencontros, não hesito em dizer que só tenho boas memórias de ti!
Dói demais pensar que desapareceste deste plano para sempre, e que nunca mais te vou rever. Sei que vou ter saudades tuas... Do teu sorriso maroto, mas sincero e contagiante... Do teu abraço apertado... Como é possível? O teu corpo inerte...! Porquê, meu Deus? Porquê tu?
Recordo-te como um portento de homem, do alto do teu metro e noventa e oito! Recordo-te como uma verdadeira força da natureza. Era impossível resistir ao teu magnetismo e ao teu charme! Lembro-me de pensar que, se fosses um carro, serias um BMW Serie 6! É assim que eu me lembro de ti! E é assim que eu te quero recordar para sempre!
Mas para sempre vai ficar também a dor de não me ter despedido de ti! Hoje olho para trás e percebo os sinais que, então, não percebi! Começaste a invadir os meus pensamentos há cerca de dois meses atrás! Foi um sonho estranho, foi o pensar em ti out of the blue e sem razão aparente, foi o teu número que reapareceu na minha agenda quando troquei de telemóvel, foi o passar à porta do teu trabalho e recordar-me de tanta coisa, foi uma vontade súbita de te ligar e saber de ti ... Parece que era o Universo a dizer-me "- Liga-lhe! Vai tomar um café com ele! É a tua última oportunidade de o veres sorrir, de o ouvires gargalhar, de o abraçares!". Ou serias tu a chamar-me para te despedires de mim?
Até o momento em que recebi a tua triste noticia.... Até esse parece um sinal... Como se encerrasse em si algum significado... Passado e presente cruzam-se, e de repente, no meio de tanta tristeza, dou comigo a pensar que a vida é demasiado efémera, e pergunto-me o que estou a fazer à minha... E fico ainda mais triste! Encosto-me à ombreira da porta e pergunto-me se a felicidade estará mesmo ali ao lado! Encerrei essa porta há uns meses atrás... Não, não encerrei... Na realidade, deixei-a entreaberta! Pergunto-me se a devo abrir novamente... Pergunto-me se ainda vou a tempo de a abrir!
Recordo-me dos meus feelings, e sinto medo... Será isto uma espécie de aviso? Do tipo "não deixes para amanhã a felicidade que podes viver hoje."? Alguém me fala de "desapego", num momento em que a vida me recorda que somos pó, cinza e nada. Vimos nus ao mundo, e do mundo apenas levamos um fato e um ramo de flores!
Despedi-me de ti com um girassol. Não é uma flor apropriada para funerais mas é a minha favorita e representa bem o que foste em vida. Enchias uma sala com a tua presença, e tudo girava à tua volta. Eras mesmo Sagitário!
O teu funeral coincidiu com o aniversário da morte da minha mãe! Foi um dia muito difícil...! Já te disse que ela te adorava? Ah... Mas tu sabias isso! Pedi-lhe que te receba do outro lado, e que te ajude a fazer a passagem! Não sei se alma sente angustia ou revolta, mas temo pela tua dor ao perceber que não vais ver crescer os teus filhos... A maior injustiça de todas...! Peço a Deus que lhes dê força, e a ti que te dê paz!
A vida foi madrasta. Sê tu um Anjo!
Obrigado por fazeres parte da minha vida.
Com carinho e amizade, até sempre Amigo!
Sem comentários:
Enviar um comentário